MARIAS, O SERGINGUEIRO POETA - Por Francisco Gregório Filho
José Marques de Sousa, o Matias, seringueiro e ativista cultural, fez uma trajetória longa e diversificada, dos seringais do Vale do Juruá até sua participação em movimentos sociais, em Rio Branco (Acre), como teatrólogo. Utilizava o teatro para denunciar e reivindicar melhores condições de vida para as comunidades menos favorecidas. Homem seringueiro – castanheiro, extrativista – década de 1970. Matias e sua família, já moradores da “periferia”, baixada, Aeroporto Velho, Baía, Palheiral, bairros de invasão.
Nessa década de 1970 é que fui conhecer aquele homem forte, falante, com expressão larga, pele queimada do sol e com alguns dentes quebrados e outros já extraídos da boca, sob um pequeno bigode de fiapos de cabelos desalinhados. Matias gostava de andar pelas ruas dos bairros e muitas vezes pelo centro da cidade sem camisa ou de camisa aberta no peito. Demonstrava uma luta cotidiana para conseguir o “feijão com arroz” para alimentar os filhos. Os pés sempre enfiados naquelas sandálias de dedo ou em alpargatas.
Uma fala mansa, macia, mas quando precisava, projetava-a de forma vigorosa. Conheci Matias numa sessão do Cineclube Aquiry, projetando o filme Vidas Secas. Durante o debate ouvi a voz contundente daquele homem que parecia personagem de filme. Fiquei comovido com aquela imagem e aquele discurso vibrante, duro e esperançoso. Um homem pós-alfabetizado e leitor de mundos (dos humanos e suas lutas sociais, políticas e culturais).
Convidei o Matias para almoçar comigo no dia seguinte. Almoçamos um prato-feito no Mercado Velho de Rio Branco. Soube então que Matias queria desenvolver com seus vizinhos as chamadas “dramatizações”. Já elaborava algumas cenas na cabeça sobre fatos ocorridos recentemente com as famílias moradoras daqueles bairros.
Matias esboçava já em folhas soltas de papel a escrita de algumas cenas das dramatizações sobre o esforço de muitos pela sobrevivência e participação político-social.
Na segunda metade da década de 1970, recebemos em Rio Branco a visita Aldomar Corrado, professor de teatro, da Escola de Teatro da FEFIERJ, do Rio de Janeiro. O professor e dramaturgo, que naquele período, era assessor do Serviço Nacional de Teatro (SNT) foi comigo assistir ao espetáculo do Grupo das Dramatizações do Matias, que se apresentava num espaço comunitário do bairro Aeroporto Velho. Naquele espetáculo o grupo encenava a morte de um rapaz pela polícia, fato real, ocorrido há alguns dias atrás. Matias conseguiu que a mãe do rapaz morto subisse ao palco para interpretar sua própria personagem. Coisa de doido. Fulminante. Emoção Pura. Depois o debate corria até tarde da noite de forma vibrante. Tempos depois o professor Aldomar escrevia sobre aquela experiência numa revista de teatro da SBAT (Sociedade Brasileira de Teatro) e em relatórios do SNT. Ganhou repercussão nacional quando foram publicados.
Matias criou então o grupo de teatro “De olho na coisa”, que participou do Teatro Barracão, da Federação de Teatro Amador do Acre e do movimento de teatro amador brasileiro. Assim lembro de Matias, poeta, dramaturgo, encenador, militante cultural e grande guerreiro das causas sociais e artístico-culturais do Acre.
Matias fez a passagem dele. Fica conosco essa memória desse brasileiro, artista, inventivo, crítico, protagonista de belas histórias para se contar e preservar. Quando encontrá-lo novamente vou pedir a benção e cantar como cantávamos juntos:
”Mandei caiar minha casa
Mandei... mandei... mandei...
Mandei caiar de amarelo
Caiei... caiei... caiei...”
José Marques de Sousa, o Matias, seringueiro e ativista cultural, fez uma trajetória longa e diversificada, dos seringais do Vale do Juruá até sua participação em movimentos sociais, em Rio Branco (Acre), como teatrólogo. Utilizava o teatro para denunciar e reivindicar melhores condições de vida para as comunidades menos favorecidas. Homem seringueiro – castanheiro, extrativista – década de 1970. Matias e sua família, já moradores da “periferia”, baixada, Aeroporto Velho, Baía, Palheiral, bairros de invasão.
Nessa década de 1970 é que fui conhecer aquele homem forte, falante, com expressão larga, pele queimada do sol e com alguns dentes quebrados e outros já extraídos da boca, sob um pequeno bigode de fiapos de cabelos desalinhados. Matias gostava de andar pelas ruas dos bairros e muitas vezes pelo centro da cidade sem camisa ou de camisa aberta no peito. Demonstrava uma luta cotidiana para conseguir o “feijão com arroz” para alimentar os filhos. Os pés sempre enfiados naquelas sandálias de dedo ou em alpargatas.
Uma fala mansa, macia, mas quando precisava, projetava-a de forma vigorosa. Conheci Matias numa sessão do Cineclube Aquiry, projetando o filme Vidas Secas. Durante o debate ouvi a voz contundente daquele homem que parecia personagem de filme. Fiquei comovido com aquela imagem e aquele discurso vibrante, duro e esperançoso. Um homem pós-alfabetizado e leitor de mundos (dos humanos e suas lutas sociais, políticas e culturais).
Convidei o Matias para almoçar comigo no dia seguinte. Almoçamos um prato-feito no Mercado Velho de Rio Branco. Soube então que Matias queria desenvolver com seus vizinhos as chamadas “dramatizações”. Já elaborava algumas cenas na cabeça sobre fatos ocorridos recentemente com as famílias moradoras daqueles bairros.
Matias esboçava já em folhas soltas de papel a escrita de algumas cenas das dramatizações sobre o esforço de muitos pela sobrevivência e participação político-social.
Na segunda metade da década de 1970, recebemos em Rio Branco a visita Aldomar Corrado, professor de teatro, da Escola de Teatro da FEFIERJ, do Rio de Janeiro. O professor e dramaturgo, que naquele período, era assessor do Serviço Nacional de Teatro (SNT) foi comigo assistir ao espetáculo do Grupo das Dramatizações do Matias, que se apresentava num espaço comunitário do bairro Aeroporto Velho. Naquele espetáculo o grupo encenava a morte de um rapaz pela polícia, fato real, ocorrido há alguns dias atrás. Matias conseguiu que a mãe do rapaz morto subisse ao palco para interpretar sua própria personagem. Coisa de doido. Fulminante. Emoção Pura. Depois o debate corria até tarde da noite de forma vibrante. Tempos depois o professor Aldomar escrevia sobre aquela experiência numa revista de teatro da SBAT (Sociedade Brasileira de Teatro) e em relatórios do SNT. Ganhou repercussão nacional quando foram publicados.
Matias criou então o grupo de teatro “De olho na coisa”, que participou do Teatro Barracão, da Federação de Teatro Amador do Acre e do movimento de teatro amador brasileiro. Assim lembro de Matias, poeta, dramaturgo, encenador, militante cultural e grande guerreiro das causas sociais e artístico-culturais do Acre.
Matias fez a passagem dele. Fica conosco essa memória desse brasileiro, artista, inventivo, crítico, protagonista de belas histórias para se contar e preservar. Quando encontrá-lo novamente vou pedir a benção e cantar como cantávamos juntos:
”Mandei caiar minha casa
Mandei... mandei... mandei...
Mandei caiar de amarelo
Caiei... caiei... caiei...”